Esta quinta-feira, Louise Glück tornou-se a 16.ª mulher a ser galardoada com o Prémio Nobel da Literatura. A escritora é a terceira norte-americana a receber o prémio e a primeira poetisa dos Estados Unidos da América a ser laureada. O júri escolheu-a pela “sua inconfundível voz poética, que com austera beleza torna universal a existência individual”. Atualmente a viver em Cambridge, Massachussetts, nos EUA, Louise Glück, de 77 anos, é professora de Língua Inglesa na Universidade de Yale.
Considerada uma das mais importantes poetisas norte-americanas, a importância da sua obra tem sido também fora do seu país natal, mas tem recebido pouca atenção em Portugal, onde nenhum dos seus livros se encontra publicado.
Alguns dos seus poemas têm, no entanto, sido disponibilizados de forma avulsa em antologias e revistas, como aconteceu com “O Poder de Circe” e a terceira parte de “Paisagem”, publicados na antologia Rosa do Mundo. 2001 Poemas Para o Futuro (2001), da Assírio & Alvim, e no número 12 da revista Telhados de Vidro, da editora Averno, respetivamente.
Apresentamos a terceira parte do poema PAISAGEM
Paisagem/3
Nos fins do outono uma rapariga deitou fogo
a um trigal. O outono
fora muito seco; o campo
ardeu como palha.
Depois não sobrou nada.
Se o atravessávamos, não víamos nada.
Nada havia para colher, para cheirar.
Os cavalos não compreendem –
Onde está o campo, parecem dizer.
Como tu ou eu a perguntar
onde está a nossa casa.
Ninguém sabe responder-lhes.
Não sobra nada;
resta-nos esperar, a bem do lavrador,
que o seguro pague.
É como perder um ano de vida.
Em que perderias um ano da tua vida?
Mais tarde regressas ao velho lugar –
só restam cinzas: negrume e vazio.
Pensas: como pude viver aqui?
Mas na altura era diferente,
mesmo no último verão. A terra agia
como se nada de mal pudesse acontecer-lhe.
Um único fósforo foi quanto bastou.
Mas no momento certo – teve de ser no momento certo.
O campo crestado, seco –
a morte já a postos
por assim dizer.
*Terceira parte do poema “Landscape”, de Averno (2006), traduzido por Rui Pires Cabral. Os versos foram publicados no n.º 12 da revista Telhados de Vidro, da editora Averno, em maio de 2009